ALERTA DOS PERIGO NUCLEAR FEITO PELO DEPUTADO DO MPT NA A.R.
CHERNOBYL E A ENERGIA NUCLEAR
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INTERVENÇÃO DO DEPUTADO PEDRO QUARTIN GRAÇA NO PARLAMENTO
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Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
Foi em 26 de Abril de 1986, faz hoje precisamente 20 anos, que ocorreu o grave acidente nuclear na central de Chernobyl em Kiev, na Ucrânia.
Tragédia provocada por falha humana e de consequências que ainda hoje perduram, um estudo publicado no passado dia 21 de Abril pelo Centro Internacional de Pesquisas sobre o Cancro, da Organização Mundial de Saúde, estima em 16.000 o número de cancros da tiróide e 25.000 de outro tipo que irão surgir na Europa até 2065, sendo que estes darão origem a mais de 20.000 mortes directamente ligados a Chernobyl ou seja, quatro vezes mais do que o número de mortes antes calculado para o Velho Continente devido à nuvem radioactiva.
Sendo certo que a maior parte das mortes respeitará às populações mais directamente expostas, seguro é também que vastas populações da Ucrânia, da Bielorússia, da Federação Russa foram afectadas.
Mas também os países da Europa Ocidental, desde a França à Irlanda, o foram. Na verdade, e de acordo com dados de Abril deste ano da Agência Internacional para a Pesquisa do Cancro, calcula-se que sejam 570 milhões os europeus atingidos pela nuvem radioactiva de Chernobyl.
Ao evocar hoje Chernobyl, pretendemos, antes de mais, prestar homenagem a todas as vítimas da energia nuclear dita «pacífica». Mas, ao mesmo tempo, e pensando no futuro de todos nós, queremos também alertar para a necessidade de contrariar a falsa propaganda que o lobby pró-nuclear vem ultimamente fazendo com o objectivo de tentar impor em Portugal a construção de centrais nucleares.
Dessa propaganda ressalta:
1. O esforço por negar a gravidade do acidente de Chernobyl;
2. A afirmação de que um acidente de gravidade comparável já não seria possível hoje;
3. A falsa ideia de que um acidente como esse nunca teria sido sequer possível num país do Ocidente, tentando assim menorizar a sua importância ao assimilá-lo ao colapso dos sistemas sociais do Leste Europeu no final da década de 1980.
4. A ideia, igualmente falsa, que as centrais nucleares da actualidade são seguras e, pasme-se, “amigas do ambiente” e até cumpridoras dos objectivos de Quioto!
5. Por último, a tentativa de convencimento dos portugueses de que a energia nuclear é barata e é a solução única para os problemas energético do país.
As razões para estas manobras de propaganda são óbvias!
Negar, menorizar ou falsear o que se passou em Chernobyl é uma peça essencial para tentar que a opinião pública portuguesa diminua o elevado grau de rejeição que tem em relação às centrais nucleares, como etapa para as poder impor a seguir.
Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
Para além da dificuldade de se obterem dados fiáveis e concretos sobre o acidente de Chernobyl mas também sobre os demais acidentes que têm ocorrido, muitas vezes ocultados pelos próprios Governos, os promotores do nuclear sabem bem que o acidente de Chernobyl está ainda vivo na memória dos portugueses de então, e até na mente de muitos jovens de hoje que não eram sequer nascidos, mas que dele ouviram falar, que o estudaram nas escolas ou dele se informaram nos jornais, rádios, televisões e internet.
Para os promotores do nuclear vale tudo! Da legítima sensibilização dos partidos à grosseira manipulação dos órgãos de comunicação social, da influência junto dos governantes à criação e divulgação de pretensos estudos de opinião ou pseudo sondagens sem qualquer base científica, a tudo assistimos nos últimos meses desde que, com pompa e circunstância, o lobby pró-nuclear, surgiu publicamente.
Mas, para levarem os seus objectivos até final, os pró-nuclearistas têm de manipular e falsear de forma grosseira a realidade, na esperança de que se cumpra o velho ditado segundo o qual uma falsidade muitas vezes repetida passa a ser considerada como verdade.
Os factos são, porém, indesmentíveis.
Em primeiro lugar: Chernobyl foi e continua a ser o maior acidente tecnológico da história da humanidade, de consequências mais devastadoras e de envergadura sem comum em comparação com qualquer outro. Não “apenas” e simplesmente o maior acidente nuclear, como alguns dizem, mas o maior acidente tecnológico de sempre.
Em segundo lugar: continua a não ser possível eliminar a eventualidade de um acidente grave numa central nuclear, por mais baixa que seja em teoria a respectiva probabilidade. Ora, em que consiste um acidente grave numa central nuclear? Simplesmente, na libertação maciça de radioactividade sem controlo, nos solos, nas águas, no ar, na fauna, na flora, nas pessoas, no ambiente.
Embora em todas as tecnologias se façam esforços e se tenda para um aumento da segurança, e o mesmo aconteça na indústria nuclear, a gravidade da libertação maciça de radioactividade não tem termo de comparação possível. É por isso que a opção nuclear é social e eticamente inaceitável. Existe apenas uma maneira de garantir que jamais se produzirá, com origem em determinado território, um acidente dessa gravidade: é não construir nele qualquer central nuclear.
Em terceiro lugar o facto de, apenas por um triz, e isso está bem documentado, um acidente de gravidade comparável ao de Chernobyl, ou mesmo superior, não ter acontecido no Ocidente.
Foi o caso de Windscale, em Inglaterra, nos anos 50 (local este que viria a ser rebaptizado Sellafield para efeitos de cosmética); e nos Estados Unidos da América, em 1979, em Harrisburg, Three Mile Island.
Para sermos rigorosos, e desde que se iniciou a actividade nuclear nos anos 50 do passado século, houve incidentes anuais em praticamente todas as centrais de produção de electricidade e em unidades de processamento de combustível e tratamento de resíduos.
Vejamos mais alguns exemplos:
- Chalk River (Canadá, 1952), fusão parcial do núcleo com contaminação radioactiva da água de refrigeração;
- Hanford (EUA, 1970), fuga radioactiva no tanque de armazenagem de resíduos;
- Greifswald (RFA, 1976), fusão parcial do núcleo com incêndio grave e falha dos circuitos de segurança;
- Tokay-Mura (Japão, 1999), grave acidente na unidade de processamento de combustível;
- Mihama (Japão, 2004), fuga no circuito de vapor.
A ideia, hoje ventilada, de que existiriam centrais nucleares ditas de «nova geração» que não estariam sujeitas à eventualidade de um acidente grave, não passa, ela também, de uma arma de propaganda. Certamente que tem sido possível melhorar os sistemas de segurança na indústria nuclear. Mas nenhuma tecnologia pode atingir uma segurança perfeita, quer por motivos técnicos na concepção e construção, quer por eventual erro humano quando em funcionamento. Só por arrogância, ingenuidade ou má fé se poderá afirmar o contrário. Ora, se nesta ou naquela tecnologia o risco pode ser corrido, no caso da indústria nuclear o que está em causa são os efeitos devastadores e longamente perduráveis da radioactividade maciça incontrolada que não consentem qualquer ligeireza na abordagem.
A maioria clara das pessoas que em Portugal prezam a vida e a segurança, as suas e as dos seus filhos e netos, rejeita essa pretensa solução.
Em Inglaterra, o Sustainable Devellopment Council, órgão oficial de consulta do Primeiro-Ministro, num relatório de 2006, rejeita com base em extensa e indiscutível documentação o recurso ao nuclear mesmo só para substituir o existente.
Segundo informações dadas pelo governo na Câmara dos Comuns, em Fevereiro passado, 311 explorações agrícolas na Escócia continuam sujeitas a medidas de segurança devido a Chernobyl, e isto a quase 3000 km de distância.
Temos pois de perguntar, e esta pergunta destina-se, evidentemente, aos defensores do nuclear: que planos de evacuação praticáveis em Portugal em caso de acidente grave seriam postos em prática? Quem seria responsável por eles e pela sua execução? Quem pagaria os custos da elaboração desses planos e da sua manutenção em prontidão permanente? Quem seguraria e resseguraria essas centrais e com que limites? Quem pagaria e até que montante os prejuízos decorrentes em pessoas e bens? Quem repararia os danos ambientais, de que modo, e por quanto tempo? Quais os cálculos que, incluindo todos esses custos, permitiriam uma estimativa realista do custo do kw/hora produzido nessas centrais?
Aos problemas relativos à possibilidade de existências de acidentes graves acrescem os resultantes do verdadeiro quebra-cabeças e que não tem solução que é o problema dos resíduos altamente radioactivos por centenas de milhares de anos e a radioactividade de baixas doses libertada em laboração normal. Esses problemas existem em toda e qualquer central nuclear, quer haja ou não haja acidente grave.
Há pois numerosas razões para rejeitar a opção nuclear. E a menor delas não é certamente o obstáculo que a energia nuclear constituiria para que o esforço da sociedade se concentre verdadeiramente na promoção do combate ao desperdício energético, no aumento da eficiência energética e no aumento das energias renováveis de baixo impacto ambiental.
Mas ainda que não existissem essas razões, bastaria a eventualidade de acidente grave para a humanidade, possibilidade sempre presente, para fundamentar a sua rejeição.
Analisemos agora o último argumento esgrimido pelo lobby nuclear: o económico, a alegação de que a energia nuclear é a resposta para a crise provocada pelo aumento do preço do barril do petróleo.Trata-se, uma vez mais, de um argumento falso. A energia nuclear é a forma mais cara de se produzir electricidade quando se considera o ciclo completo.
A indústria nuclear é um autêntico fiasco já que apenas sobrevive com base em subsídios públicos, directos ou indirectos, como em França. Nos últimos 50 anos, os subsídios públicos à energia nuclear foram na ordem dos 145 biliões de dólares sendo que, em contraste, os subsídios às energias renováveis se cifraram em apenas 5 biliões.
Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
Em Fevereiro deste ano, o Primeiro-ministro, José Sócrates, afirmou publicamente que o nuclear não estava na agenda deste Governo. Os portugueses não se sentiram sossegados com esta afirmação. E tinham razões para isso. Na passada semana, apenas escassos dois meses depois, foram os mesmos portugueses surpreendidos pelo mesmo Eng. José Sócrates quando este afirmou que “Portugal deveria desencadear um "debate racional" sobre a energia nuclear, à semelhança do que ocorre em vários países europeus”.
Mas disse mais. Citando a imprensa, para o Eng.º José Sócrates, verifica-se uma "mudança de contexto" e ainda uma “a elevação dos níveis de segurança nas centrais nucleares nas últimas duas décadas, após o acidente de Chernobyl”.
O Primeiro - Ministro referiu ainda que, alegadamente, países como a Grã-Bretanha relançaram o debate público sobre a energia atómica e que um outro país europeu, a Finlândia, está neste momento a construir uma central nuclear. Mas convém lembrar que para além desta desonrosa excepção, não se constroem centrais nucleares na Europa Comunitária e nos Estados Unidos desde Chernobyl.
Tudo isto para quê?
Para, no nosso entender, e cedendo às evidentes pressões do lobby nuclear, tentar preparar mentalmente os portugueses para a alegada inevitabilidade de existência de centrais nucleares em Portugal.
Ocorre perguntar ao Senhor Primeiro – Ministro se não estará já em preparação uma nova Comissão Científica para o nuclear, pretensamente independente, a exemplo da malfadada comissão da co-incineração. Mas também porque não falou o Senhor Primeiro – Ministro do que se passa em Espanha, aqui mesmo e lado e país repetidamente referido por este nosso governante, noutras áreas, como exemplo a seguir?
A resposta é simples. O Sr. Eng.º José Sócrates sabe bem, mas faz de conta que não sabe que, em Espanha, o Governo socialista do PSOE se comprometeu ainda este mês a ratificar a moratória nuclear e reiterou a promessa da substituição progressiva da energia nuclear por outras formas de energia, mais seguras, mais limpas e menos custosas.
Espera-se, aliás, para breve o início do programa de fecho e desmantelamento em Espanha das centrais nucleares existentes, até ao ano de 2015.
Em Portugal, qualquer decisão política que possa ser tomada nesta matéria, nunca o poderá ser sem a clara, inequívoca e directa participação da população, através da figura do referendo nacional.Até lá, é a memória e o empenho daqueles que, há 30 anos, lutaram contra o nuclear em Ferrel que nos permite hoje, como no passado, continuar a afirmar com redobrada convicção:
NUCLEAR DE NOVO, NÃO OBRIGADO !
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